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quarta-feira, 1 de junho de 2011

História:Tragédia na lagoa de João Pessoa 1975‏

Na tarde de domingo do dia 25 de agosto de 1975, o jornalista Gilvan de Brito teve um sonho nebuloso: nas brumas oníricas, estava com amigos que já haviam morrido e sendo perseguido por criaturas de olhos flamejantes com rostos enfurecidos.
Não sabia ele que o presságio se desdobraria para a realidade naquele Dia do Soldado, no auge da Ditadura Militar no país. Para celebrar a data, o exército promoveu durante a semana, a céu aberto, uma exposição no Parque Solon de Lucena, em João Pessoa. O evento mostrava equipamentos bélicos obsoletos, usados na Primeira Guerra Mundial, com algumas armas, metralhadoras, tanque ‘mata-mosquito’ e fotos espalhadas entre o Cassino da Lagoa e a subida da rua Sinésio Guimarães.
Gilvan não se animou com a ideia de sua mulher de levar seus três filhos para apreciar tal exposição, principalmente por se lembrar das inúmeras vezes que era convocado pela junta militar para explicar seus textos jornalísticos.
Chegando lá, a principal atração era uma espécie de embarcação de porte médio chamada portada, instalada nas águas da lagoa. “Pode ver nas fotos de Djalma Góes da época, a lotação normal do barco, que era de 60 pessoas. Na última viagem tinha quase 200 passageiros em pé, 95 por cento de crianças”, relata Gilvan ao JORNAL DA PARAÍBA.
O sol já se punha quando a portada começou a afundar no meio do trajeto. “Eu presenciei, fui à rádio dar a notícia e quando voltei, ainda vi o barco afundar”, relembra o jornalista. “Os bombeiros ouviram meu chamamento e chegaram em quatro minutos porque a corporação funcionava bem pertinho, à rua Maciel Pinheiro. Foi só subir o Ponto de Cem Réis e descer pela Padre Meira, a rua mais próxima do ocorrido.”
Mas o resultado do fatídico incidente foi o saldo de 35 mortos, sendo 29 crianças, na faixa etária de três a 12 anos. Quase 36 anos depois, Gilvan de Brito remonta o ocorrido com reminiscências e pesquisa em Opus Diaboli - A Lagoa e outras tragédias, livro produzido através do Fundo Municipal de Cultura (FMC) da Prefeitura de João Pessoa.
ABRAÇO DO AFOGADO
Segundo Nota Oficial emitida pelo 1º Grupamento de Engenharia, em dado momento da travessia, houve um alarde de que a embarcação estava fazendo água, o que causou o pânico. As pessoas se aglutinaram na frente da portada, fazendo com que o barco submergisse com o peso. A única medida de segurança não evitou as mortes: um bote pneumático ao lado da portada.
Entre as vítimas, um sargento que pilotava o batelão e um soldado, que morreu no terceiro mergulho de salvamento, imobilizado por uma desesperada jovem, afogando-os para o fundo da poluída lagoa.
A tragédia saiu estampada nas capas da Veja, Manchete, IstoÉ, Fatos e Fotos, Folha de S. Paulo, O Globo, Jornal do Brasil, entre outras publicações no âmbito nacional. “A mídia na época estava sob censura. Tinha um funcionário do governo na ‘boca da máquina’ todas as noites para autorizar –ou não– os textos dos repórteres”, relembra Gilvan. “O meu texto não ficou de fora dessa prática generalizada da ditadura, com o agravante de que o fato dizia respeito a eles próprios num episódio onde foram os principais culpados pela falta de segurança e superlotação.”
O escritor ainda faz um apanhado de ‘outras tragédias’ que aconteceram na Lagoa e na Paraíba. São recortes históricos e jornalísticos que vão desde 1501, quando uma expedição pré-colonial sofreu uma emboscada pelos nativos no lugar onde hoje é chamado de Baía da Traição, passando pelas vítimas de cólera no século 19 e o rompimento da barragem de Camará, no município de Alagoa Grande, em 2004.
DOCUMENTÁRIO NO CORAÇÃO DA CIDADE
O cineasta e diretor de fotografia João Carlos Beltrão tinha apenas três anos e estava em Alagoa Grande quando aconteceu a tragédia. Desde os 15 anos, o paraibano passou boa parte de sua vida morando na rua Princesa Isabel, nas imediações do Parque Solon de Lucena.
Munido desse convívio íntimo e cotidiano com o lugar, João teve a ideia de produzir um documentário colocando a Lagoa como pano de fundo. O que ocorreu em 1975 não será o foco principal, mas será um bloco importante para o longa-metragem. “Minha preocupação não é o fato (da tragédia) em si, mas discutir além disso como a questão da memória”, avisa. “João Pessoa sabe do fato, porém perdeu a dimensão.”
Com uma gama de registros audiovisuais capturados, João Carlos tem desde imagens raras de 1947, até depoimentos de nomes famosos como o cantor Zé Ramalho, cujo um amigo e músico da banda se matou nas águas turvas da lagoa. Outras questões como o aterramento do local, acidentes envolvendo veículos, manifestações políticas e artísticas, entre outros temas, também serão acobertados na produção.
Segundo Beltrão, a partir de agosto vai “sentar a pua” no projeto, arrematando as histórias e preparando o documentário – ainda sem nome– para ser lançado em 2012.
Com a devida venia a Paraíba Hoje

Um comentário:

  1. Eu não era nascida nesse ano, mas cresci ouvindo e imaginando as cenas tristes dessa tragédia que tirou a vida de uma tia e três primos (todos irmãos) meus.
    Minha avó ( ja falecida), contava que não queria deixar a filha mais velha ir ao Parque Solon de Lucena, mas para não sair como uma mãe “chata”, disse a filha para pedir ao pai (meu avô também ja falecido), e ele concedeu…e nunca mais se perdoou!
    Ela tinha 10 anos, e foi junto com os primos, quase da mesma idade, acompanhada pela irmã mais velha deles.
    Com a família, aparentemente, não havia risco algum e todos foram sem maiores problemas.
    Mesmo com medo, por não saber nadar… ela entrou na barca com os primos e o resto da multidão…quando de repente acontece o terrível e inesquecível acidente.
    Meu pai, triste, conta até hoje, que meu avô não o permitiu ir ao passeio pois seu sapato estava velho, e ele não tinha um sapato novo, e, revoltado, meu pai chorou muito porque sua irmã (eles tinham 1 ano de diferença, mas estudavam juntos desde muito novinhos), foi e ele não!
    Não lembro agora, como maus avós souberam do acidente, mais foram rapidamente ao local e , meu avô tentou ajudar no resgate, em pânico pensando na filha e nos sobrinhos… Muito triste imaginarr tudo isso…
    Mais ele não pôde fazer muito coisa pelas vítimas, já que o primeiro corpo que resgatou foi o de uma das sobrinhas, ja morta…ele então desmaiou!!!
    Depois de toda a tristeza desses regates tensos, chegava a hora dos velórios.
    Estavam lá quatro caixões na sala da casa da mãe dos três irmãos e os corpos dos três estavam lá, menos o da minha tia, que foi um dos últimos corpos encontrados,pois estava coberto de lama e preso dentro da lagoa…
    E é com esses e mais detalhes que eu conheci a triste história da tragédia na Lagoa em 1975.
    Minha família até hoje sente muito por essas perdas, mais graças e com fé em DEUS conseguiram suportar a dor da saudade, sem esquecer, jamais, dos parentes que se foram.
    Para meu pai, a volta ao cólégio foi um martírio. Eel sempre foi muito inteligente, porém tinha uma preguiça de pensar que dava dó, e quem fazia suas tarefas de casa era justamente a irmazinha mais velha e super inteligente e que vivia ao seu lado pra tudo.
    E assim termino meu, breve, comentário.
    Obrigada pela atenção.
    Morgana Leite.

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